domingo, janeiro 16, 2011

Nada de novo.


Gostaria de escrever sobre algo diferente do que vai aparecer nas linhas seguintes, porém, a minha cabeça gira em torno disso, a minha vida também. Eu nao tenho nenhum outro motivo para viver a não ser isso. Você deve estar se perguntando, "sobre o quê ele esta falando?". Eu falo sobre organização e estudos. Sem essas duas coisas, eu entro em um vazio completo. Hoje fez um belo dia de sol, eu mal o aproveitei, por dez segundos eu pus a cabeça para fora da minha janela e peguei um pouco de seus raios luminosos.
Eu estou estudando Lettres Modernes na universidade Grenoble 3 Stendhal. Ela se situa no campus universitaire, na cidade de St. Martin D'Heres, França. Eu moro na cidade ao lado, Grenoble, numa residência de estudantes (Le Rabot). Depois de ter abandonado o curso de literatura no Brasil, e passado por uma experiencia religiosa, eu recebi um convite da minha irmã de visitar a França e, quem sabe, retornar aos estudos de letras nesse novo lugar. Eu achei interessante, porque sempre fui interessado em conhecer coisas diferentes que tenham um pouco de dificuldades para chegar ao resultado positivo. Bom, tive um mês e meio para me organizar para toda a função. Passaporte, traduçao de documentos, visto, dinheiro, etc. Meu mundo estava se esvaziando de coisas do passado e se enchendo de burocracia e papéis. Estressei a minha mãe, a minha irmã, enfim, toda a minha familia, nesse periodo de tempo, mas pus o pé no avião e decolei. Coisas que precisam ser informadas ao leitor, antes de tudo, eu estava indo para um pais onde nao conhecia quase nada da lingua e da cultura. "Bonjour" , "merci" e "je ne sais pas parler français" era o que eu sabia dizer. Estava indo para o desconhecido, conhecia alguns escritores, mas o meu conhecimento é realmente inferior do que é exigido para um estudante que quer fazer literatura francesa. Antes de começar a faculdade e estudar a literatura, era preciso saber falar frances, o minimo que fosse. Eis o primeiro desafio, pois a proposta era um ano de estudos em frances e depois iria ver se era possivel continuar ou não na universidade. Nas primeiras semanas, fiquei completamente dependente da minha irmã, um pouco de protecionismo dela, um pouco de falta de atitude minha, enfim, foi um inicio um pouco assustador. Me sentia numa bolha, pessoas falando coisas que eu nao fazia nem idéia. O meu curso de frances, nivel debutante, estava demorando para começar. Esse sentimento de bolha se prolongou. Primeira residencia que habitei, Condillac, uma das residências mais mal afamadas da cidade. Mas, por alguma "sorte", consegui um bom quarto. Desde que eu me conheci por gente, eu dividi a cama com a minha mãe, os quartos com as minhas irmãs, etc. Ja tive um quarto so meu, mas sempre sofri a invasao da mãe, das irmãs, da tia e do pai com sua terceira esposa que queriam utilizar o computador ou fazer qualquer outra coisa no quarto. O que era meu era dos outros também. O quarto da Condillac, foi o primeiro quarto pago e realmente so meu. Em duas semanas nesse pais, eu consegui um trabalho. A minha irmã havia informado aos seus amigos que eu precisava de um emprego, esse era um motivo de inquietaçao nessas duas semanas. Foi a primeira grande noticia para alegrar a todos e dizer que esse inicio prometia. Aqueles que nao tinham muita fé nessa minha empreitada, ja mudaram suas opiniões. A alegria foi geral. O curso ainda nao tinha começado, e eu estava começando a trabalhar. Nesse trabalho havia dois brasileiros, eles me ensinaram tudo o que eu tinha que fazer nesse restaurante. Eu nao entendia nada o que os outros diziam, meu primeiro dia de trabalho foi um nervosismo total, nao sabia se isso era realmente o que eu queria, mas nao tinha mais como voltar atras, eu me prometi em jamais olhar para tras ou querer desistir disso que estava tentando. Sempre via como uma situaçao de prova para ver o quanto eu era capaz de suportar. Nao fazia nada muito dificil, o meu problema era a lingua e a falta de pratica do trabalho. A pratica veio mais rapido que o aprendizado da lingua francesa. Cada dia que passava eu ia deixando alguma coisa do meu passado para tras, eu nao fiz nenhum gesto contra essa mudança, me joguei sem hesitar nesse novo universo. Rapidamente, decorei o meu numero de telefone, os nomes dos "trams", o endereço da casa da minha irma, da sogra dela e do curso de francês, que enfim havia começado. Um sentimento de diferença a todo momento, com todos a minha volta. Estava estranhando muito. Isso me machucava, pois não era um turista, um estudante de échange ou de intercâmbio. Estava vindo para viver um ano, sendo que tinha largado uma vida completamente diferente. Bom, depois dessa primeira parte do inicio, a poeira foi baixando, mas outras inquietaçoes foram surgindo. A minha irmã fazia uma pequena pressão para eu me enturmar, eu realmente queria curtir essa solidão. Era um tempo que eu precisava para assimilar essas mudanças. Uma coisa que eu logo percebi que o tempo passa muito rapido, comecei a participar do circulo de conversaçao do curso de francês, fui progredindo, mas sempre bloqueado para uma conversação espontanea. Fazia dois cursos de frances nivel A1, que consistiam em duas aulas por semana cada, duas na terças e quintas a noite e duas nas terças e quintas de manha. Meu trabalho no restaurante era das 11:45 até as 13:45, duas horas por dia, eu tinha a possibilidade de almoçar la. Os cursos de conversaçao eram na segunda a noite, na quarta a tarde e na quarta a noite. Havia um voluntario do curso de Frances que me ajudava nos estudos toda a sexta feira a tarde, ele me convidava para jantar toda sexta a noite. Enfim tinha a possibilidade de amelhorar o meu francês, mas estava sempre bloqueado para o dia-a-dia. O que me impedia, eu acho, era o tempo normal de assimilaçao. Nao conseguia mudar isso, ou mesmo a pressao que sofria em ouvindo dos outros " em um mês ja estava falando", " em tres meses tu ja vai falar", "em 3 meses ela estava se comunicando", bom isso me fazia pensar que eu tinha esse mesmo tempo para fazer o mesmo. Chegando o mês de dezembro, a minha mãe havia decidido em fazer uma visita. Na verdade, não sabia se isso ia atrapalhar no meu aprendizado, pois queria falar o menos possivel em português. Sabia que ela estava disposta à vir não importando o que eu dissesse, aliàs ela tinha bancado toda a minha viagem, nao tinha como dizer não. Ela veio, tivemos alguns conflitos, momentos bons também, viajamos pela Espanha, na cidade de Barcelona, passamos o natal e o ano novo juntos. Ela foi embora em janeiro, ja fazia tres meses que eu estava aqui mas nao estava me comunicando como o esperado. Nesse mês de dezembro falei muito em português, fiquei a maior parte do tempo com a minha irmã e minha mãe. Português, português e português. O segundo desafio estava preste a surgir, o exame para entrar na faculdade. Como eu disse, nao estava tão bem como o esperado na comunicação em francês, com os estudos de jornais, revistas e filmes adquiri um bom vocabulario e ja tinha alguma noção de escrita. Porém a prova exigia um nivel B1, e eu estava no nivel A1+ no curso de françês. Esse exame tinha sido previsto para setembro, mas na verdade nao era bem assim. O caso é que eu não podia continuar meus estudos do ponto que eu tinha parado no Brasil e teria que começar toda a graduação. Eu segui em frente sem hesitar, nao queria voltar para o Brasil so com o curso de francês. Para entrar no primeiro ano de graduação numa Universidade Francesa, era preciso fazer o exame de nivelamento de frances em fevereiro. Até fevereiro eu teria quase cinco meses de estudo na lingua. Nao recebi muita motivação para fazer esse exame, meu professor pensava que eu não era capaz e que eu estava disperdiçando meu dinheiro, ela me disse isso. Bom, eu ja havia pago o exame, eu teria que fazer de toda forma, com ou sem a ajuda do professor. Nesse meio tempo eu conheci uma chinesa, nos chegamos a namorar. Foi um momento que me deixou menos sozinho e mais contente. Comecei a frequentar os cinemas e restaurantes com ela, foi legal, comecei a falar frances quase todo dia também. Os cursos não davam muita abertura para o estudante expressar o seu conhecimento. O momento que eu tinha para me expressar era na quarta a noite e na sexta feira, o voluntario para o curso de conversaçao dava a oportunidade do aluno falar. Com a minha namorada foi mais um momento que eu podia falar tranquilamente em francês, sem estar sendo avaliado. Chegado o dia do exame, houve uma morte e um renascimento causado por uma falha minha que até agora eu não consigo explicar. Eu perdi o exame, considerei o horario de termino do exame como o horario de inicio. Eu morava ao lado da universidade, cheguei la quase ao meio dia, o exame ja estava quase no fim e não podia fazê-lo. O mundo desabou. A minha irmã lavou as mãos e me encheu de cobranças, estava estressada pois pensava que as culpas iam cair sobre ela ou que eu iria ficar esperando que ela solucionasse o problema. Bom, eu nao sabia o que podia fazer, a secretaria da universidade nao teve nenhuma boa vontade de explicar o que poderia ser feito, sua boca se abria somente para dizer que não era possivel. Nessa noite nao estava muito animado, havia brigado com minha irmã, em resumo, resolvi tomar um porre. Estava podre de bêbado no meu quarto, pois voltar para o Brasil com as mãos abanando era algo bem possivel, recebi o apoio da minha namorada e do voluntario do curso de frances, conversei com eles pelo celular e pela internet completamente embriagado. Uma das soluções era continuar o curso de frances e tentar no ano seguinte. Mas ao falar com a minha mãe sobre isso, a minha irmã se manifestou, resumo, essa idéia foi vetada, pois poderia nao conseguir. Eu tinha que tentar de todas as formas de fazer esse exame. Eu ja havia mandado diversos e-mails para diversos lugares, mas as respostas não chegavam, as esperanças eram as minimas. Mas na segunda feira, eu recebi uma resposta do e-mail enviado para a instituiçao responsavel pela prova de nivelamento de francês. A mensagem dizia que havia um segundo teste em Paris e que eu podia escrever uma carta explicando o motivo de ter perdido o exame. Foi o que eu fiz. Na minha carta de justificativa, eu disse que perdi o exame porque a minha irmã tinha estado doente. A minha irmã tinha estado realmente doente nessa semana, entao não era completamente mentira o que eu estava dizendo. Bom, a solução havia sido encontrada e o mais importante, sem a ajuda da minha irmã. Agora era preparar a viagem para Paris, cidade até então nunca vista por mim. Paguei hotel, a namorada ia junto, estava tudo certo. Fiz o exame, conheci Paris, estava bem acompanhado, foi perfeito. A vida continuou, tinha feito o necessario. O mês de abril havia chegado, comemorei meu aniversario sem nenhuma grande celebração. Um jantarzinho romantico com a minha namorada e deu. Nesse mesmo mês recebi o resultado do exame, o teste mostrava que o nivel que eu atingi na prova era B1, mesmo fazendo um curso de nivel A1+ e com todas as desmotivações do meu professor, eu consegui a média. Mandei os documentos para a universidade. A secretaria nao pode recusar, a universidade tinha que analisar o meu dossiê para ver se eu podia ser aceito. Eu havia entrado no processo normal de avaliaçao da faculdade, até o fim do mês eu iria receber uma resposta. Num sabado eu recebi uma carta da Universidade Stendhal, eu sabia que dentro dela podia estar o sim ou o não da resposta. Não tendo a coragem de abrir fui até a minha irmã, ja não estavamos mais brigados. Ela me disse para abrir logo aquela carta, a resposta foi positiva, a universidade tinha pré-aceitado, ou seja ainda faltava uma ultima inscrição. Mesmo assim, a alegria foi geral. A minha namorada não se manifestou muito, na época ela ja estava mudando, estava trabalhando 8 horas por dia, tinha largado os estudos e isso ja era o inicio de um fim, ja nao nos comunicavamos muito. Nosso relacionamento desgastou e em junho acabamos, foi triste mas não tive tempo para refletir muito. As exigencias para a entrada na Facul eram varias. A minha irmã estava se preparando para ir para o Brasil, o verao europeu estava chegando. O meu trabalho no restaurante estava chegando ao fim, pois era uma instituiçao universitario, no momento que acabasse o ano escolar o restaurante iria fechar. Nesse tempo estive lendo alguns livros em frances, terminando os cursos de frances e procurando um trabalho para as férias. Antes da minha irmã partir, ela conseguiu com sua amiga um trabalhinho em troca de uma moradia. Eu teria que cuidar de uma gata durante o mês de julho e agosto. Os seus donos iriam partir ao Brasil também com sua filha de poucos meses. Havia tambem a casa da minha irmã e o felino dela, que eu tinha que cuidar também. Entao fiquei com esse serviço no verão. Sai da residencia condillac, ja havia feito o pedido para a residência Le Rabot e agora era estudar para a faculdade. As mudanças foram cansativas, tive que pegar tudo que tinha na Condillac e levar para a casa dos brasileiros. Depois teria que pegar todas essas coisas e levar para o Rabot. Os dois meses com a Popo foram marcantes. Acabei no ritmo dessa gata noturna, seguia todos os seus horarios. O verão europeu é quente! No fim de agosto ja estava super apegado a gata, mas tudo tem seu fim né. Devolvi a casa e o felino aos seus respectivos donos. Eles gostaram do estado da casa, mas eu havia quebrado um calice de vinho, um pote de plastico, e estragado o microondas. Que vergonha! Eles nao falaram nada, mas mesmo assim não é muito legal né? Com a ajuda do sogro da minha irmã eu levei todas as coisas para o Rabot. O quarto era diferente, o piso era cinza e velho, dava a impresséao de sujo, mas a vista era a melhor. E foi isso que mais me atraiu nessa residência. o mês de setembro havia chegado, e a inscrição definitiva para a universidade devia ser feita. Fiz a inscriçao no ultimo dia de validade do meu passaporte, eu tinha pensado que havia um mês de tolerancia apos o vencimento do passaporte, mas na realidade não tinha. A minha inscriçao havia sido feita, o meu dinheiro estava no fim, nao havia trabalhado nesses dois meses de férias. Tentei de novo o restaurante, mas dessa vez houve dois problemas, o passaporte e os horarios das disciplinas. Com o passaporte vencido, não poderia trabalhar, teria que esperar a revalidaçao do visto, apos ter conseguido isso, os horarios das disciplinas não correspondiam com os horarios do trabalho. Resumo, o chômage(desemprego) da frança havia me atingido. De setembro a dezembro fui me virando como pude, recebendo as ajudas da minha familia. Em dezembro recebi uma ajuda da assistente social também. Enviei meu curriculo para varios lugares, mas nao recebi respostas. Os exames me atrapalharam também. A minha cabeça ficou completamente cheia de preocupações, mas eu tinha que continuar. Esse inicio de semestre foi realmente dificil. Apesar de ter me apaixonado completamente pelo curso, ter me enturmado na residencia, ter melhorado a minha comunicaçao e a minha escrita eu tinha a instabilidade financeira a todo tempo. Agora, eu terminei os exames do primeiro semestre, tenho que achar uma estabilidade ainda, pois é isso que eu preciso fazer para continuar aqui. Sinto que houve mudanças, e que ainda estou sendo testado para ver té aonde eu aguento, os meus objetivos são os estudos e o aprendizado do francês. O resto é lucro!

3 comentários:

  1. Wagner, lindo relato, mas não gostei muito do que falaste sobre mim. Parece que eu sou a causa da desgraça que nunca te apoio.
    Enfim, não vou pedir para modificar o texto, ja q é a tua visão das coisas, mas eu vejo algumas passagens um pouco diferentemente.

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  2. Laura querida, sei falar do que passou e dos conflitos que nos tivemos não é facil. Mas, naofalo com raiva, e nem quero te por como vilã nessa historia. Se tu for ver, tua pessoa é relacionada muita às soluçoes tbm. Eu disse que nao precisei de ti no lance do exame, mas não é verdade. Eu te utilizei como justificativa, então, quase todo o tempo tu esteve me ajudando e acho que esse texto nao contraria isso. Mas tivemos um conflito, tu estava doente, nao nos falamos e tal. Mas passou e hj tu continua me apoiando e eu sou muito agradecido. Foi uma briguinha que relatei. nada de mais.

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  3. Oi filho eu te conheço bem e nem sempre o que falas é o que realmente sentes, no sentido de que expurgas um pouco os demonios e por isso nao os sentes mais, hehe, eu adoro tua personalidade perseverante e séria e isso é que importa, vais chegar la e no fim das contas estas mesmo é curtindo tudo isso, como tudo na tua vida. beijo bem grande da mae.

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