quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Meu olho, meu guia. (Parte 4)

O senhor idoso:
O meu avô foi um homem de muita importância neste lugar, era uma cidade sem muito a acrescentar, porém, ele estimulou os camponeses a trabalharem e desenvolverem sua cultura, logo, a prosperidade pairou naquela região. É uma pena ninguém reconhecer isso e chamarem ele de bêbado. A minha avó foi a primeira mulher a se separar na cidade, uma mulher de fibra, tratou dos 7 filhos sozinha, trabalhando como enfermeira na primeira guerra civil que acontecera por aqui. É também uma pena as pessoas dessa cidade a conhecerem como a prostituta dos guerrilheiros. Os sete filhos homens, foram criados em meio as guerras que aconteciam,tinham uma noção muito forte sobre política. A população não gostava muito dos meus antepassados, pois eles chegaram antes da igreja e tinham mais influência. Os padres, insatisfeitos com a situação, começaram a pregar contra eles nas missas e assim a "boiada" só precisou mugir igual. Com o passar do tempo, de pessoas influentes os "Vernica De La Baña" se tornaram os excluídos da sociedade. Todos os meus tios morreram nas guerras que aconteceram por aqui, somente um foi morar no exterior em uma comunidade diferente, dizia ter recebido a iluminação através de um som. O meu pai se casou com a filha do açougueiro, eles foram felizes até eu nascer, no dia do meu nascimento o primeiro prédio de limpeza facial foi posto na cidade e logo a "Era da manicure" dominou por longos doze anos, todos faziam unhas, cabelos, plásticas e tinham alguns que trocavam de pele, estes foram chamados de "geração cobra". Haviam os que protestavam, faziam culto ao feio e isso se tornou uma força terrorista dentro da cidade. Essa foi a minha infância, convivi com alegorias e sacos de batatas(roupas dos revoltados), o meu pai e minha mãe tinham ideologias diferentes, minha mãe era fundamentalista e o meu pai era o senhor barba-feita-unhas-limpas. Eu nunca vi uma briga deles, mas, um dia eu ouvi a minha mãe chorar, ela escondia o rosto, cheguei na sala e a chamei, ela estava maquiada, disse que ele tinha a obrigado a fazer isso. Depois dessa cena eu virei fundamentalista, fui morar em um buraco que tinha nos fundos de casa, era para ser uma piscina, mas nunca foi continuada. Neste buraco fiquei vivendo de luz, água da chuva, algumas minhocas e formigas.
A "era da manicure" já havia acabado, eu tinha 14 anos de idade e os opostos se juntaram para formar o movimento "simples", buscava o bom dos dois lados e defendiam a tese de se ter chegado a um ideal verdadeiro. Porém foi uma época de muita violência, a "geração cobra" foi caçada, queimada e muitos salões de beleza e buracos de fundamentalistas foram fechados. Eu virei um refugiado, a minha mãe me apoiou no início, mas após um tempo pediu para que eu voltasse para casa e tentasse viver essa vida "equilibrada". Não quis discutir com ela. Tive uma longa conversa com meu pai, tomamos um porre, brigamos e sorrimos, não conseguia aceitá-lo de outra maneira se não fosse assim: depois de muito conflito. Isso não me motivou voltar para casa, somente larguei a bandeira de fundamentalista e virei um "simples" ser. Fiz faculdade de "Sapataria e comércio inútil", me formei com 20 anos e me casei com uma modelo de saco de batatas. Nossa vida foi simples, tive uma loja de souvenirs e dois filhos. Um morreu logo que começou a ir a escola e o outro por não ir a escola sobreviveu. O meu segundo filho lutou em algumas guerras civis que aconteciam por estas bandas e sumiu por dez anos, voltou casado com uma guerrilheira, não tive muito contato com ela pois logo os dois morreram em uma dessas guerras deixando o meu neto para eu cuidar. O guri é até hoje muito criativo, aprendeu tudo sozinho cheio de talento, mas sempre teve um olhar sério para a vida, é um pouco calado o menino.

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